Com praias exuberantes, a capital de Pernambuco tem ainda arte, cultura e boas histórias para contar
Se você já está planejando uma viagem para as férias de julho ou mesmo quer viajar para fugir dos dias frios de inverno do Sul e do Sudeste brasileiro, uma dica é Recife, a vibrante capital de Pernambuco. Situado no Nordeste, o Estado possui 187 km de praias azuizinhas e esverdeadas – uma mais bonita do que a outra. Não é tudo. Transborda história, cultura, alegria e excelente gastronomia. Tudo isso em um só lugar!
Recife é cercada por rios, interligada por pontes e repleta de ilhas e mangues. É também a terra do frevo, contagiante ritmo que nasceu em Pernambuco no final do século 19 e que, em 2012, foi declarado Patrimônio Cultural Imaterial pela Unesco. Para dar uma ideia, só o Galo da Madrugada, um dos mais tradicionais blocos carnavalescos do País, leva mais de um milhão de foliões às ruas e ladeiras de Olinda durante o reinado de Momo.
Com sol praticamente o ano inteiro, a cidade é abraçada por duas praias: a de Boa Viagem e a do Pina, ostentando uma orla por onde se desfilam centenas de coqueiros emoldurados por águas ora mais azuis, ora mais esverdeadas, dependendo da estação do ano – na primavera e no verão são mais turquesa. No inverno e outono, época de chuva, ficam mais esmerada devido às folhagens que caem no mar.
Urbana e badalada, a primeira tem 7 km de extensão, reunindo quiosques, bares e quadras poliesportivas, entre outras opções de lazer. As melhores áreas para banho de mar são indicadas por placas de sinalização, mas o surfe ali é proibido. Já a do Pina é uma praia com longa faixa de areia. É bastante frequentada por moradores da cidade, com quiosques e barraquinhas. Além dessas praias, as do Litoral Sul e do Norte têm cenários para todos os gostos.
Indo em direção ao Sul, em Jaboatão dos Guararapes, cidade vizinha e integrante da Região Metropolitana de Recife ficam as praias da Piedade, de Candeias e Barra de Jangada. Com águas claras e arrecifes, a primeira é de mar aberto e habitada por tubarões nas áreas mais profundas. Por isso, também ali o surfe é proibido, mas o banho de mar em área liberada não oferece perigo.
Já a de Candeias é ideal para banhos de mar, com águas rasas e calmas. Também oferece infraestrutura turística, com bares, restaurantes, hotéis e pousadas. Situada entre Candeias e a foz do Rio Jaboatão, Barra de Jangada tem águas escuras e rasas, resultado do encontro do rio com o mar. Do pontal da Barra, pode-se fazer a travessia de barco até a Ilha do Amor, praia de vegetação intocada que fica próxima à costa.
Mais ao Sul, em Cabo de Santo Agostinho, município que fica a 13 km de Recife, encontram-se a Praia do Paiva (não tem infraestrutura para turistas), com areia branca, mar agitado e vegetação nativa de Mata Atlântica. Com a maré seca, piscinas naturais se formam por conta dos arrecifes. Na região também fica a Enseada dos Corais, praia de veraneio de areia dourada, piscinas naturais e águas transparentes.
Pouco mais distante, tem a Praia de Gaibu. No passado, servia como porto negreiro. Atualmente, é uma praia bastante movimentada por veranistas. Tem areia clara e fofa, águas limpas, piscinas naturais e falésias. Seu mar agitado e com ondas é perfeito para os surfistas. Já a Praia de Calhetas, pequena baía com areia grossa e pedras na orla, antigamente, funcionava como porto das tropas portuguesas que lutavam contra os holandeses.
Por sua vez, a Praia de Suape é uma enseada, com mar de águas translúcidas e tranquilas, protegida por uma barreira natural de arrecifes e coqueiros a perder de vista. No passado, foi palco de batalhas entre portugueses, holandeses e índios caetés. Hoje, é propícia para a prática de esportes náuticos. Possui barcos de pesca na areia, hotéis e pousadas, bares e restaurantes, incluindo os que servem comida típica.
É no Litoral Sul, no município de Ipojuca, que fica umas das praias mais badaladas do Estado: Porto de Galinhas. Com praias de areia branquinha, abriga piscinas de águas cristalinas habitadas peixinhos coloridos e ouriços. É também ideal para a prática de esportes náuticos, como jet ski, passeios de jangada e mergulho. Com boa infraestrutura turística, a vila tem seu comércio movimentado por restaurantes e bares, oferecendo ainda uma agitada vida noturna.
Essas são apenas algumas das praias do Litoral Sul de Recife, mas há outras. E no Litoral Norte também não faltam opções. É ali que, por exemplo, fica Itamaracá, ilha que deu nome a uma das capitanias hereditárias do Brasil e foi palco de disputas coloniais no século 17, quando os holandeses construíram o Forte Orange. A construção em taipa de 1631 foi demolida, sendo reconstruída pelos portugueses em 1654 para proteger as vizinhas Igarassu, Olinda e Recife.
Além do forte, Itamaracá tem belíssimas praias – a principal e mais concorrida delas, por motivos óbvios, é a do Forte, onde fica o de Orange. A ilha também é o lar do Ecoparque Peixe-Boi & Cia, lar da sede nacional do CMA, um centro especializado do ICMBio. No momento, o parque de proteção ao animal marinho está fechado, mas é possível saber se foi reaberto pelo site www.icmbio.gov.br/cma/guia-do-visitante.html.
Também no Litoral Norte está Maria Farinha, praia de extensa faixa de areia dourada e mar calmo e limpo. Embora ainda não seja muito divulgado pelas agências de viagem, o lugar oferece boa infraestrutura turística. Na baixa temporada, a praia fica praticamente deserta. Mais adiante e de frente à Ilha de Itamaracá, o município de Goiana é a casa da Barra de Catuama.
Primitivamente ocupada por índios caetés e potiguaras, a vila ainda possui uma reserva indígena não preservada pelas autoridades. Encontro do Rio da Barra com o Itapessoca, sua praia conta com umas das áreas mais ricas em biodiversidade do Litoral do Nordeste do País. A vila possui uma pequena rede hoteleira e fica perto do distrito de Pontas de Pedra, onde está a maior parte das lojas e mercados da região.
Marco Zero – Em sua estadia na capital pernambucana, não deixe de conhecer o Recife Antigo, com suas coloridas fachadas. Interligado ao resto da cidade por inúmeras pontes, o bairro deu origem à cidade no século 16 e reúne um importante conjunto arquitetônico, grande parte reconstruído após a invasão holandesa, no fim do século 17. Principal polo de cultura e animação de Pernambuco, tem ainda efervescentes barzinhos, restaurantes e casas noturnas.
É neste bairro que também ficam a primeira sinagoga das Américas (leia abaixo), a Embaixada dos Bonecos Gigantes, o Paço do Frevo, o Centro do Artesanato de Pernambuco (um antigo armazém de cargas restaurado onde é possível conhecer o trabalho de mais de 700 artesãos) e o Museu Cais do Sertão, que propõe uma imersão na cultura do sertão e na obra do rei do baião Luiz Gonzaga. É ainda o endereço de uma feirinha de artesanato que acontece aos domingos.
Se quiser conhecer o bairro do alto, suba ao topo da Torre Malakoff que data de 1855. Se não é adepto das alturas, explore o lugar a partir da Praça do Marco Zero, palco das principais festas populares da cidade. Ao redor da praça, exposições de arte e exibições de filmes estão sempre presentes à programação gratuita do Centro Cultural dos Correios (Av. Marquês de Olinda, 262), do Santander Cultural (Av. Rio Branco, 23) e da Caixa Cultural (Av. Alfredo Lisboa, 505).
É também do Marco Zero que partem os barqueiros que fazem a travessia de ida e de volta para o Parque das Esculturas Francisco Brennand, construído sobre um recife em frente à praça. Em seu interior estão guardadas 90 esculturas do artista plástico pernambucano que empresta o seu nome ao lugar. A principal delas é a Coluna de Cristal, com 32 metros de altura e confeccionada em argila e bronze.
Ainda é bom saber que grande parte das obras desse escultor e artista plástico pernambucano está exposta na Oficina de Cerâmica Brennand, no bairro da Várzea. A oficina funciona desde 1971 em uma antiga fábrica de tijolos construída no início do século 20 e reúne esculturas, painéis de azulejos e pinturas de Francisco Brennand. Saiba também que, em Recife, o que não faltam são museus.
O Instituto Ricardo Brennand é um dos principais deles. Instalado em uma réplica de um castelo medieval, reúne obras de arte, objetos e documentos do período da ocupação holandesa, além de pinturas datadas do século 18 ao 20. Guarda ainda uma imensa coleção de armas brancas, com armaduras medievais e espadas milenares. Pelos seus jardins (um deles foi criado por Burle Marx e exibe fontes e lagos) espalham-se esculturas de Rodin e Botero, só para citar algumas.
Obrigatória também é a visita à A Casa da Cultura de Pernambuco, prédio que originalmente foi uma cadeia. Em suas antigas celas hoje funcionam 150 lojas de artesanato, restaurantes, lanchonetes e livrarias, incluindo uma especializada em livros da história de Pernambuco e em autores pernambucanos. Situado no bairro de Santo Antônio, é o maior centro da cultura e arte de Pernambuco, abrigando artesanato de 147 municípios do Estado, do litoral ao sertão.
Nas lojas, você vai encontrar peças em barro ou cerâmica na arte figurativa de mestre Vitalino: desde bonecas e jogos de xadrez e de damas até anjos, imagens sacras em terracota e santos em madeira. Há ainda as lojas que comercializam camisetas, biquínis, cangas, peças exclusivas em couro (bolsas, sandálias e chapéus), bordados para cama, mesa e banho e confecções em renda renascença, filé e algodão natural.
No pátio externo, transformado em uma área para shows e manifestações populares e folclóricas, também funciona uma praça de alimentação, com espaços que oferecem iguarias típicas da região: a tapioca, a pamonha, a canjica, o acarajé, a rapadura de alfinis, o mel de engenho, a cachaça pernambucana, castanhas, passas de caju e o tradicional bolo-de-rolo, hoje Patrimônio Imaterial do Estado.
Tesouro colonial – Por falar em rapadura, cachaça e engenhos, a Capitania de Pernambuco foi uma das principais protagonistas do ciclo da cana-de-açúcar do Brasil Colônia entre os séculos 16 e 18, quando o açúcar foi a primeira grande riqueza agrícola e industrial do País e a base da economia colonial. Vale lembrar que esta capitania também era integrada pelo atual Estado de Alagoas, somente tendo sido desmembrada em 1817, após a Revolução Pernambucana.
Foi exatamente esse tesouro agrícola o responsável pela Invasão Holandesa no Brasil, em 1630. Interessados na produção do açúcar, os holandeses, enviados pela Companhia das Índias Ocidentais, invadiram, dominaram e permaneceram em Pernambuco até 1654, ano em que foram expulsos. Impossível falar sobre esse assunto sem citar Maurício de Nassau, um conde alemão, à serviço da Holanda, que chegou ao Brasil em 1637.
Nassau veio com o objetivo de governar as terras dominadas pelos holandeses na região de Pernambuco. Seu governo durou até 1644. Durante os sete anos que governou, ele fez pesados investimentos e várias transformações, principalmente urbanísticas, em Recife – algumas delas podem ser vistas até hoje por quem visita a cidade. Caso da construção de diversas de pontes, diques, canais, sistema de drenagem de pântanos e obras sanitárias.
Também melhorou a qualidade dos serviços públicos em Recife, investindo na coleta de lixo e nos bombeiros. Ainda na atual capital pernambucana, Nassau criou os palácios de Friburgo e da Boa Vista, o Jardim Botânico, o zoológico e o Museu Natural. Foi ainda um incentivador do estudo e da retratação da natureza brasileira, trazendo diversos artistas e cientistas holandeses ao País.
Na área religiosa, Nassau permitiu a liberdade de culto entre holandeses, italianos, franceses, belgas, alemães, flamencos e judeus. Esses imigrantes chegavam ao Brasil vindos da Península Ibérica e do Norte europeu. Buscavam aqui a tolerância religiosa que não havia na Europa – lembram-se da Inquisição? Foi no século 17, que judeus e cristãos novos fundaram uma sinagoga no Recife, considerada a primeira das Américas.
Nas instalações da Kahal Zur Israel (Congregação Rochedo de Israel), como é chamada a sinagoga, atualmente funciona o Centro Judaico de Pernambuco, no bairro de Recife Antigo, no centro histórico da cidade. Escavações revelaram um poço usado no mikvé, ritual judeu de purificação. Se for passar uns dias em Recife, vale a pena visitar. Fica na Rua do Bom Jesus nº 197 e funciona de terça a sexta-feira, das 9 horas às 16h30. Domingo, das 14 horas às 17h30.
Quanto ao açúcar, Nassau fez aliança política com os senhores de engenho e reduziu os tributos cobrados deles, além de ter adotado melhorias nos engenhos e ter introduzido métodos aperfeiçoados de cultivo da cana-de-açúcar, visando o aumento da produção de açúcar. No começo da década de 1640, porém, a Companhia das Índias Ocidentais adotou amargas medidas a fim de aumentar os lucros com a economia açucareira no Brasil.
Entre essas iniciativas estavam o aumento de impostos, a cobrança de dívidas atrasadas dos senhores de engenho e a pressão para aumentar a produção de açúcar. As novas regras causaram muita insatisfação nos engenhos e também não foram aceitas por Nassau, que resolveu deixar o cargo de governador em 1644. Sua saída deu fim as relações harmoniosas entre os holandeses e os senhores de engenho.
Desgostosos, estes últimos buscaram o apoio de colonos e se organizaram, formando exércitos, a fim de expulsar os holandeses. A meta foi conquistada em 1654 com a Insurreição Pernambucana. Este ano é comemorado os 380 anos da vinda de Nassau ao Brasil. Ele é apontado como um bom governador pelos pernambucanos devido às realizações implantadas que proporcionaram modernidade e desenvolvimento à região.
Quando se compara os governos holandês e o português no Brasil (bem mais interessado na exploração econômica), muita gente acredita que a região dominada pelos holandeses hoje seria mais desenvolvida se eles tivessem permanecido aqui por mais tempo. Mas, é bom saber que todas as melhorias foram feitas por Nassau, já que a Companhia das Índias Ocidentais apenas se preocupava com o lucro que obtinha com a produção de açúcar.
História e governos à parte, saiba que visitar Recife e não conhecer a encantadora Olinda, distante apenas 10 km da capital, é quase como cometer um pecado mortal. Patrimônio Histórico e Cultural da Humanidade, a cidade com suas ladeiras, igrejas barrocas dos séculos 16 e 17 e construções coloniais é – por si só – um charme a mais de Pernambuco. Sem falar da imperdível vista para o mar que proporciona a quem a visita. Mas essa é uma história a ser contada em um próximo capítulo. Até lá!
Fotos: Wikimedia e Wikipedia