Mais conhecido pela feira de arte e artesanato que realiza desde a década de 1960, o município paulista é um dos mais antigos do país e tem muita história para contar. Suas ruas guardam casas de taipa e construções arquitetônicas típicas dos tempos do Brasil Colônia, um dos mais preservados tesouros históricos remanescentes em São Paulo.
Por Fabíola Musarra
Embu das Artes é uma cidade alegre. Animada, a simpática estância turística recebe milhares de visitantes todos os fins de semana, quando abriga em seu centro histórico a Feira Internacional de Artes e Artesanato. Os turistas chegam de todos os cantos, mas são, sobretudo, paulistanos – afinal, o município fica a meia hora da capital paulista. Embu das Artes, porém, não é só um polo regional da cultura brasileira. Concilia o charme de uma típica cidade do interior a atrações para todos os gostos, desde passear pelas suas bucólicas ruas de paralelepípedos para conhecer um pouco da história e da arquitetura do Brasil Colônia e fazer compras de objetos de arte e decoração até desfrutar de seus espaços verdes, resquícios da Mata Atlântica que por ali se espalham.
O centro histórico de Embu das Artes é, por si só, uma atração imperdível. Abriga preservadas casas de taipa e construções que revelam como era a arquitetura nos tempos do Brasil Colônia. Ali também estão o Centro Cultural Embu das Artes, o Museu do Índio, a Capela São Lázaro, o centro de informações ao turista e diversas pousadas e restaurantes de gastronomia nacional e internacional, além de uma praça de alimentação com 25 quiosques. Mas, sem dúvida, a principal estrela do lugar é a Feira Internacional de Artes e Artesanato.
Idealizada pelo escultor Claudionor Assis Dias, o mestre Assis do Embu, como era conhecido o artista que morreu em 2006, a feira existe desde 1969, quando foi criada por artistas que tinham ido morar na cidade a partir de 1920. Entre eles, o pintor Cássio M´Boy, os mestres Sakai e Gama, Solano Trindade e Ana Moysés. Juntos, mais do que ajudar a fundar a feira, esses artistas projetaram internacionalmente a cidade, fazendo com que ela se transformasse em um sinônimo de arte.
Em seus 43 anos de existência, a feira foi ocupando todas as ruas do centro histórico de Embu das Artes, um circuito hoje conhecido como Passeio das Artes. É nesse imenso ateliê ao ar livre que 550 expositores mostram as suas obras, desde pinturas, porcelanas, esculturas, instrumentos musicais, roupas e bijuterias até objetos utilitários. Não são os únicos. Ao redor da feira encontram-se ainda diversas galerias de arte, antiquários e lojas de artesanato e de móveis artesanais de estilo rústico. Muitos deles abrem nos fins de semana e feriados.
Saindo do centro histórico, no bairro de Vila Cercado Grande, fica o Memorial Sakai, com um acervo de peças do artista japonês Tadakiyo Sakai (1914-1981), um dos maiores expoentes da escultura em terracota do país. Ao lado do memorial situa-se a Capela de Santa Cruz. Em seu altar há uma cruz de madeira ladeada por dois anjos de terracota com suas violas, criada pela artista Helaine Malca.
Não muito distante dali, na Avenida Professor Cândido Motta Filho, uma raridade que merece ser conhecida: a Fonte dos Jesuítas. Situada dentro de um “santuário ecológico”, a fonte somente foi descoberta em 1944 e é uma das mais antigas do Brasil. A exemplo desse lugar, Embu das Artes tem ainda muitos outros espaços de vegetação remanescente de Mata Atlântica, com trilhas que são um tentador convite a caminhadas.
Na direção diametralmente oposta à fonte está Parque do Lago Francisco Rizzo, com mais de 217 mil metros quadrados de área verde e um imponente lago povoado por dezenas de espécies de peixes. De moderna infraestrutura, possui brinquedoteca, pistas de cooper, biblioteca sobre meio ambiente e viveiro de mudas. Fica na Rua Alberto Giosa.
História e arquitetura – Embu das Artes nem sempre se chamou assim. Até recentemente seu nome oficial era Embu, mas foi modificado após a realização de um plebiscito no ano passado. Também não faz muito tempo que se tornou um município – pertenceu à Itapecerica da Serra até 18 de fevereiro 1959, quando se emancipou. Esta cidade que é uma das mais antigas do país é simplesmente apaixonante para quem gosta de história. Até o século 16, a região era povoada por tupiniquins, índios guerreiros e violentos. Os jesuítas bem que tentaram, mas não conseguiram catequizá-los. Expulsos, partiram em busca de um lugar próximo dali para se fixar. Em 1554, ao lado dos índios guaranis, com quem já conviviam, os religiosos fundaram a aldeia de Bohi, depois M’Boy, a meio caminho do mar e do sertão paulista.
Em 1607, as terras do lugarejo passam a ser de Fernão Dias (tio do bandeirante Fernão Dias, o Caçador de Esmeraldas) e Catarina Camacho. Em 1624, o casal doa as terras da aldeia M’Boy à Companhia de Jesus, com a condição de que os jesuítas devotassem Nossa Senhora do Rosário e organizassem uma festa de adoração à Santa Cruz. Em 1690, o padre Belchior das Pontes manda erguer uma igreja em homenagem àquela santa, hoje a padroeira do município.
Em 1730, os jesuítas constroem a sua casa ao lado da igreja. Não moram ali por muito tempo: por ordem da Coroa Portuguesa, são expulsos do Brasil em 1759. Os padres vão embora, mas deixam um tesouro para a cidade paulista: um belíssimo conjunto de arquitetura colonial, hoje sede do Museu de Arte Sacra, no centro histórico. Tombado como Patrimônio Histórico Nacional e protegido pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), é uma das mais preservadas construções jesuítas remanescentes em São Paulo.
Embora exiba detalhes do estilo barroco paulista, a arquitetura do conjunto tem como principal característica a simplicidade das linhas retas. A edificação é composta pela antiga casa dos padres e pela igreja Nossa Senhora do Rosário, construída em taipa de pilão e parcialmente concluída em 1734, quando a pintura e douração da capela-mor e da sacristia começaram a ser feitas. Faz parte de seu acervo imagens de anjos, santos e personagens bíblicos entalhados em madeira, modelados em terracota ou em armações de roca, produzidos pelos jesuítas entre os séculos 17 e 19. O ponto alto do museu é a obra “Senhor Morto”, esculpida em tamanho real em uma única tora de madeira.
Palco da história e dona de um privilegiado conjunto arquitetônico colonial, Embu das Artes ostenta ainda uma natureza rústica e exuberante. Com todos esses atrativos, não fica difícil de entender o porquê esse singular pedacinho de paraíso de São Paulo vive, respira, transpira e produz arte o tempo todo.
Cobra, árvore ou ensino?
Embu se desenvolveu a partir do crescimento da aldeia M’Boy, “cobra grande”, como definem alguns de seus habitantes. Há, contudo, outras versões intrigantes. De origem tupi, a palavra pode ser traduzida como “água de cobra”, resultado da uma junção de mboîa (cobra) e y (água), ou umbu, a árvore de pequeno porte que no Brasil Colônia era chamada de ambu, imbu e ombu, corruptelas da palavra tupi-guarani y-mb-u, que quer dizer “árvore que dá de beber”. Outra possível tradução é “ensino”, pois mboé significa “ensinar”.
* A jornalista Fabíola Musarra visitou Embu das Artes a convite da Assimptur Assessoria de Imprensa e do Espaço Terra Hotel.