Cumuruxatiba – Berço e berçário de um país tropical

Com um litoral exuberante e preservada Mata Atlântica, a pequenina vila de pescadores do extremo Sul da Bahia é o endereço das baleias jubarte, nos meses de junho a novembro. É também a região onde o Brasil foi descoberto em 1500.

 

Vista aérea da acolhedora vila situada no Litoral do Sul da Bahia. Foto: Wikimedia

Não é nada fácil chegar a Cumuruxatiba, uma pequena vila de pescadores no extremo Sul da Bahia. Mas, longe de ser um obstáculo, essa dificuldade de acesso é um dos principais atrativos do lugar. Afinal, graças à ela, a “cidadezinha” mantém intacta sua estonteante beleza natural. Com uma extensa orla, pela qual se aninham praias de águas translúcidas entrecortadas por imponentes falésias, o distrito que pertence ao município baiano de Prado é um oásis de paz.

Areias douradas colorem as praias do vilarejo. Foto: André Pessoa

Com ruas de terra – apenas as centrais são pavimentadas –, Cumuru, como é carinhosamente chamada pelos seus cerca de cinco mil moradores, é o endereço certo para quem quer passar os dias num dolce far niente, sentado na areia da praia ou em uma de suas barracas apenas contemplando o Oceano Atlântico. Num incessante vaivém, o mar se exibe diante do olhar, alternando tons que vão do azul-turquesa ao verde-esmeralda. Imperdível!

As cinematográficas águas que banham a cidadezinha. Foto: Wikimedia

Em Cumuru, a vegetação e a fauna da Mata Atlântica estão praticamente inalteradas. Seus habitantes levam a vida de um modo simples, convivendo em total harmonia com a natureza. Exatamente por isso, não é o lugar ideal para quem procura o agito das baladas cosmopolitas, embora ofereça boa infraestrutura: tem hotel, pousadas, cafés, bares, restaurantes, pizzarias, farmácias e supermercados, além de ateliês de artesanato e agências de turismo que oferecem diversas opções de passeios, a maioria deles via mar.

Conforme a  época do ano, o passeio de barco dá o direito a avistar as jubartes. Foto: Divulgação

O passaporte de um deles dá direito a uma viagem à terra da emoção, onde habita a indisfarçável sensibilidade do ser. Trata-se do passeio marítimo para avistar as baleias jubarte (Megaptera novaeangliae), também conhecida como preta, corcunda e cantora.

Todos os anos, elas partem da Antártica rumo às águas tropicais da Costa das Baleias, a extensa faixa do litoral brasileiro que abrange os municípios baianos de Prado (do qual Cumuruxatiba faz parte), Alcobaça, Caravelas (é a cidade mais próxima do Parque Nacional Marinho dos Abrolhos, um dos maiores berços reprodutivos do Atlântico Sul), Nova Viçosa e Mucuri, já na divisa com o Estado do Espírito Santo.

Berçário de baleias

Dizem que Deus é brasileiro, pois exagerou na natureza que concedeu ao nosso País! No litoral de Cumuru é muito fácil acreditar nisso. Ali, navegando na imensidão turquesa-esmeralda de suas águas, as baleias jubartes podem ser uma prova viva disso. Elas frequentam todos os oceanos, mas escolhem o nosso para namorar, acasalar e ter seus filhotes. Como um ritual, esse espetáculo se repete, ano após ano, sempre no mês de junho, quando elas aqui chegam. Em sua temporada em águas nacionais, esses cetáceos de 16 m de comprimento e mais de 40 toneladas não comem nada, apenas “casam” e procriam.

Em novembro, regressam às geladas águas polares, onde se alimentam de krill, um crustáceo semelhante ao camarão, numa longa viagem de mais de quatro mil quilômetros. Antes de partir nessa jornada que dura em torno de dois meses, as fêmeas dão à luz a um único filhote. Ele nasce com 4 a 4,5 m de comprimento e pesa de 800 quilos a uma tonelada. Depois, chega a engordar 50 quilos por dia. É alimentado pelo leite da mãe, cujo teor de gordura, cerca de 40%, é tão alto, que não se mistura com a água do mar.

A cauda da jubarte é a sua cédula de identidade. Foto: Projeto Jubarte

Pouca gente sabe, mas as jubartes têm uma impressão digital e podem ser identificadas pela cauda (jamais a de uma será igual a de outra), o que facilita o trabalho dos biólogos na luta para a preservação da espécie, que até bem pouco tempo estava praticamente extinta.

Aprendizados à parte, na prática o difícil mesmo é não se emocionar quando, há 17 milhas da costa (algo em torno de 40 km), em pleno alto mar, as jubartes surgem na imensidão azul. Dóceis e serelepes, chegam bem pertinho das embarcações, ao lado de seus filhotes. Saltam, mergulham, esguicham água, mostram a cauda. Somem e reaparecem, num espetáculo no qual são as principais protagonistas.

A exibição parece ser ensaiada, mas é só mais uma peça produzida pela perfeita engrenagem da natureza na qual o homem está inserido. Cada apresentação é única e não há adulto que não vire criança nessa hora. Afinal, a costa brasileira é o berço e o berçário dessas baleias: as doces baianas!

Mãe e filhote de baleia jubarte “passeiam” nas águas do Litoral Sul baiano. Foto: André Pessoa

De volta à terra, a região tem muitos outros encantamentos para compartilhar. Seu belíssimo litoral é um deles. É integrado por 12 praias, quatro delas ao Sul e sete ao Norte de Cumuru, além da Praia do Centro. De Sul ao Norte, cada uma delas tem seu charme – as suas paisagens modificam-se radicalmente conforme a maré. Quando alta, ela encobre os corais. Quando baixa, permite longas caminhadas mar à dentro. As incansáveis idas e vindas do mar, aliás, são as responsáveis pelos índios pataxós terem batizado a vila com o nome de Cumuruxatiba. No idioma deles, a palavra significa grande diferença de marés.

No vaivém das ondas

O marco zero do roteiro para conhecer as praias é o centro de Cumuru, banhado pela praia de mesmo nome. De águas mornas e calmas, é repleta de coqueiros, amendoeiras e tem uma barragem de coral que se estende por toda sua extensão. Na maré vazante pode-se caminhar longas distâncias mar à dentro. A praia abriga o principal cartão-postal do distrito: um píer de madeira dos anos 1950. Construído por uma empresa alemã para facilitar o acesso de navios à vila para retirada da areia monazítica, posteriormente foi parcialmente destruído por um incêndio.

Corais na central Praia de Cumuruxatiba. Foto: André Pessoa

Partindo-se do centro de Cumuru, no sentido Sul e por ordem de distância, ficam as praias Dois Irmãos (2 km), Areia Preta (4 km), Japara Mirim (8 km) e Japara Grande (10 km), que não possuem bares ou barracas. Com falésias de mais de 30 m de altura e águas calmas e quentinhas, elas possibilitam refrescantes banhos de mar. Nas duas primeiras é preciso ter cuidado para não se machucar com os corais que ficam encobertos pela areia. Já Japara Mirim e Japara Grande são desertas, sendo por isso frequentadas também pelos adeptos do naturalismo.

A Praia Japara Mirim,ao Sul de  Cumuruxatiba. Foto: André Pessoa

No sentido contrário, ao Norte do centro, encontram-se as praias do Rio do Peixe Pequeno (2,5 km), de águas límpidas, e do Rio do Peixe Grande (4 km), onde o recuo da maré permite a caminhada por mar à dentro. Os rios do Peixe Grande e do Peixe Pequeno dividem essas duas praias

Por sua vez, a Ponta do Moreira (8 km) exibe um dos cenários mais icônicos da região: uma praia quase deserta, repleta arrecifes de corais e de coqueiros. Já o acesso à Praia do Imbassuaba (10 km) é por uma propriedade particular. Praia deserta de ondas fracas, é banhada pelo Rio Imbassaba, enquanto a Praia do Calambrião (14 km) aninha um mar azul-esverdeado, corais, falésias e o Riacho Itaipu.

Praia Ponta do Moreira: cenário de céu e mar paradisíaco. Foto: André Pessoa

Em seguida, vem a da Barra do Cahy (18 km), cujo acesso é feito pelas fazendas Cahy e Glória. A praia é conhecida pelo desembarque de Nicolau Coelho, um dos heróis do Descobrimento do Brasil. A última praia é a do Corumbau (52 km), que temo como destaque um banco de areia que se estende por mais de 600 m, formando uma enseada onde é possível ver peixinhos multicoloridos e outras espécies que habitam ou visitam os corais.

Berço do descobrimento

Cumuru não é só litoral. Também tem cultura e muita história para contar. Na praça do centro, por exemplo, fica a Igreja de Santo Antônio, o padroeiro do distrito. Bem à sua frente, está o mastro de São Sebastião, o protetor dos pescadores. Todos os anos numa festa popular que mescla a fé cristã à alegria profana dos brasileiros, o santo é carregado pelos habitantes da região. Juntos, percorrem um trajeto em que rezam, bebem e cantam enquanto referenciam São Sebastião, agradecendo as bênçãos por ele concedidas ao longo do ano.

O rio de água doce acompanha o caprichado vaivém do Atlântico. Foto: André Pessoa

A vila conta ainda com dois mirantes – o do Morro da Fumaça e o do Morro do Cantagalo –, onde a paisagem paradisíaca enche os olhos e a alma de todo e qualquer ser mortal. Logo na entrada de Cumuru, há uma represa. Suas águas doces são perfeitas para um mergulho ou passear de caiaque corrente acima, numa trajetória em que o silêncio só é interrompido pelos passarinhos.

Um dos descontraídos e rústicos mirantes da vilinha. Foto: Andre Pessoa

Quanto à história, os nativos de Cumuru orgulham-se de o Brasil ter sido descoberto na região, mais precisamente na Barra do Cahy. A questão gera polêmica, pois as vizinhas Cabrália e Porto Seguro também alegam ter sido o palco do feito de Pedro Álvares Cabral. Registros históricos, porém, descrevem que o Monte Pascoal foi avistado em 22 de abril de 1500, quando as 13 naus e caravelas da esquadra portuguesa estavam ancoradas a 3 km da costa, em frente à foz do atual Rio Cahy, a 65 km ao sul de Porto Seguro.

Praia Barra do Cahy, onde o Brasil teria sido descoberto pelos portugueses. Foto: André Pessoa

Na manhã seguinte, Nicolau Coelho, um dos capitães da frota de Cabral, zarpou a bordo de uma pequena embarcação pela foz do rio rumo à terra firme. Ele foi primeiro português a pisar em solo tupiniquim e a fazer contato com os índios que ali se encontravam. Os pataxós, por sinal, ainda hoje vivem nas aldeias Tiba, Cahy e Pequi ao norte de Cumuru. As visitas são permitidas e o passeio que possibilita conhecer de perto a cultura e os costumes dos indígenas é comercializado nas agências de viagens da vila.

O Monte Pascoal visto do mar. Foto: Guia do Turismo Brasil

Cultura, história, natureza intacta, praias deslumbrantes. Cumuruxatiba não é só isso. A antiga vila de pescadores é mágica e pura magia. Mais do que isso, é o “jeitinho baiano” de Deus provar que é mesmo brasileiro! É preciso falar mais?

Vídeo: http://www.youtube.com/watch?v=jO0E_E-cuqM

SERVIÇO

Como chegar

Falésias fazem parte dos cenários de Cumuru. Foto: André Pessoa

A empresa São Geraldo (www.saogeraldo.com.br) disponibiliza ônibus, com saídas diárias de São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo e Minas Gerais para Prado, Itamaraju e Teixeira de Freitas, de onde será preciso pegar um ônibus da Expresso Brasileiro, alugar um carro, pegar um táxi ou contratar um transfer. Outra opção é a aérea via Porto Seguro. De lá, as opções para chegar à vila (distante cerca de 350 km) são os ônibus, carro alugado, táxi, ou traslado.

Onde ficar

Pousada Rio do Peixe: O simpático casal de paulistanos Luiz e Milene Polato comanda essa propriedade de 5.500 m2, com 70 m de praia e muito verde. Seus apartamentos têm varandas com vista para o mar, ar condicionado, tevê e telefone. Oferece café da manhã (não deixe de provar os bolos feitos pela Milene) e almoço. Imperdível também é assistir o pôr do sol do deck da piscina ouvindo o som do movimento das ondas do mar. Tel. (73) 3573-1213.

Paisagens de Cumuruxatiba. Foto: André Pessoa

Pousada É: Chefiada pelo casal Esther Correia de Faria e Hans Fritsch, dispõe de 12 apartamentos com mezzanino e vista para o mar. Seu jardim bem cuidado, repleto de árvores e flores, e os detalhes da decoração de seus espaços interiores revelam o esmero de seus proprietários. Tel. (73) 3573- 1007.

Cumuru possui várias outras pousadas, entre as quais a Axé (73) 3573-1030), a Clara (73) 3573-1112) e a Vereda Tropical, agora rebatizada por Villa Cumuru (73) 3573-1070.

Onde comer

Catamarã: Instalado no alto de uma falésia e de frente para o mar, o ponto alto desse bar e restaurante é o arroz de polvo. Tel. (73) 3573-1124.

O Arroz de polvo é um dos destaques do menu do Catamarã. Foto: André Pessoa

Cores e sabores: O Peixe à Cumuru é o carro-chefe do cardápio. Criado por Ivany, proprietária da casa ao lado do maridão Edy, o budião guarnecido com banana da terra e gratinado com queijo, é divino. Tel. (73) 3573-1406.

Mama África: A chef angolana Dolores Kuenzi serve pratos típicos de sua terra natal adaptados para a gastronomia brasileira. Tel. (73) 3573-1319.

Petiscos & guloseimas

Batataria e Pizzaria Cumuru: serve dez tipos de batatas recheadas. Entre elas, a Trio, com lagosta, polvo, camarão e requeijão, além de 20 variedades de pizzas. Tel. (73) 3573-1421.

Cocada da Neuza: a cocada de forno inventada pela Neuza Oliveira Nobre é uma das mais famosas da região. Oferece ainda as tradicionais cocadas de diversos tipos de frutas. Tel. (73) 8824-7482.

Gellato Café: As bebidas à base de café são a especialidade da casa comandada pelos dentistas Andréia e Ricardo. Com moderna decoração e música ambiente, oferece salgadinhos, sanduíches, massas italianas artesanais, brusquetas, doces e sorvetes, além de vinhos, drinques e cervejas artesanais. Tel. (73) 3573-1024.

Artesanato

Ateliê Eliana Begara: a arquiteta cria esculturas e objetos decorativos e utilitários em argila esmaltada, além de peças em cerâmica feitas com a técnica raku, processo de queima japonês. Tel. (73) 3573-1076.

Uma das peça criadas por Eliana Begara. Foto: André Pessoa

Ateliê Renato Homem: as mandalas são um traço marcante do trabalho dessa artista natural de Minas Gerais. Ela também produz uma grande variedade de objetos artesanais e decorativos em cerâmica, madeira, tecido e vidro. Tel. (73) 3573-1224.

Passeios e receptivos

Aquamar Ecoturismo (73) 3573-1360), Libra Embarcações (73) 3573-1127 e Cumuru Magical Tour (73) 8833-9448: as duas primeiras agências disponibilizam passeios náuticos para avistar baleias nos meses de junho a dezembro, além de tours marítimos para Corumbau, Recife Pataxó e Caraíva, entre outros. Já a última oferece traslados e passeios de barco e terrestres.

Cumuru oferece encantadores cantinhos para descanso e  relaxamento. Foto: André Pessoa

Também os taxistas Antônio (73) 8803-3934 e (73) 9113-5930 e Elenilson (73) 3573-1004 fazem traslados e passeios pela região.

Inclua na bagagem

Dinheiro – Cumuru não tem agências bancárias nem caixas eletrônicos – os mais próximos ficam em Prado.

Saiba e memorize o código de Discagem Direta à Distância (DDD) da vila – 073 – e não se esqueça de agendar o transfer com boas horas de antecedência da saída de seu voo ou ônibus. Os 32 km da estrada de terra que separam Cumuru de Prado nem sempre são transitáveis, especialmente quando chove. Também não é difícil encontrar um trecho da estrada para Porto Seguro interditado por um acidente envolvendo os caminhões que transportam eucalipto na região.

Evite sustos e vacine-se antes de ir! Embora Cumuru tenha farmácias e um posto de saúde, este último nem sempre está aberto durante a semana.

 

Crédito da  abertura do texto: A doce jubarte brinca nas águas quentinhas de Cumuru. Foto: André Pessoa

0 thoughts on “Cumuruxatiba – Berço e berçário de um país tropical

  1. Oi Fabiola, estava procurando sobre incenso e oracoes e me deparei com teu artigo sobre Incenso – A suave magia da fumaça perfumada – e achei que tu gostaria de saber mais origens historicas sobre esse assunto. Se estiver interessada, por favor, escreva para meu email, carlamenezes50@yahoo.com, ou entra no Facebook e me adiciona – \”Minhas Telas – Carla Menezes – para te mandar a fonte de onde tirie e como cheguei nisso. Nao tenho nenhum interesse financeiro, mas um interesse genuino para esclarecer, nunca escurecer.

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